Da escravidão à liberdade
Na África antiga, uma vida humana podia
ser trocada por um punhado de conchas ou alguns litros de aguardente ou
uns sacos de tabaco ou alguns metros de tecido ou uma dúzia de
braceletes. Havia outras moedas de troca, mas a mais valiosa de todas,
sem dúvida, era a arma de fogo. Armas que garantiam o poder militar,
político e econômico de um grupo sobre outro, sustentaram infinitas
guerras e, assim, geraram batalhões de prisioneiros que vieram povoar e
construir a América. As viagens eram feitas em tenebrosos navios
negreiros, com centenas pessoas empilhadas em porões fétidos, recebendo
cotas mínimas de água e alimento, apenas o suficiente para não morrer1.
A primeira condição para ser escravo era vir de longe, ser considerado
um estrangeiro, ainda que essa distância não fosse maior que alguns
quilômetros.
Para alimentar a fileira de escravos africanos a
serem embarcados, os traficantes brasileiros e europeus contavam com as
constantes guerras entre povos vizinhos, como as que ocorriam entre os
jejes do Daomé e os iorubás do reino de Oyó. Quem vencia, capturava e
vendia os inimigos. Mas qual a razão de tanta briga? Para entender
melhor tudo isso, procuramos o historiador e professor Valdemir
Zamparoni, que morou alguns anos em Moçambique. Especialista em História
da África, Zamparoni nos deu a seguinte resposta:
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Os africanos são humanos, como qualquer pessoa. Há os desejosos de poder e as vítimas do poder. Quando um Estado traficava membros do outro, traficava um inimigo. Eles não se viam como iguais.
Os comerciantes José, Joaquim e Antonio estavam entre
os homens mais ricos da Bahia no século XIX. De José de Cerqueira Lima,
conta-se que o seu palácio no bairro da Vitória era a residência mais
luxuosa de todo o estado, tanto que emprestou seus móveis incrustados de
marfim e pratarias para mobiliar o Palácio do Governo quando Dom Pedro
II visitou Salvador. Cada dia mais rico, Joaquim Pereira Marinho recebeu
da corte títulos de barão, visconde e conde. Membro fundador do Banco
da Bahia, também fez parte de instituições de caridade como a Santa Casa
da Misericórdia, que o homenageou com uma estátua que está até hoje em
frente ao hospital Santa Isabel, no bairro de Nazaré. Já Antonio Pedrozo
de Albuquerque possuía quarteirões de casas, muito ouro, prata,
diamantes e engenhos, tudo recebido como pagamento de dívidas. Esses
três nobres senhores tinham em comum a mesma fonte principal das suas
fortunas: o tráfico de escravos.
Em seu livro Fluxo e refluxo – do tráfico de escravos entre o Golfo do Benin e a Bahia de Todos os Santos,
Pierre Verger trata desses e outros detalhes que fizeram do tráfico
“até a metade do século XIX a grande fonte de rendas na Bahia”. Um
negócio rentável não só aqui, pois movimentou fortunas entre
comerciantes de todos os povos. Seja negociando produtos que seriam
trocados por escravos, seja vendendo, comprando ou transportando os
africanos, todos lucraram com o negócio: portugueses, ingleses,
holandeses, americanos, brasileiros, italianos, franceses, belgas,
espanhóis, dinamarqueses, suecos e muitos outros. Na história do
tráfico, nem mesmo as vítimas escapam de ser vilões. Isto é, houve uma
elite africana que colaborou e lucrou com a atividade, capturando e
vendendo membros de povos vizinhos.
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A escravidão sempre existiu. Há quem diga que em todas as sociedades humanas sempre houve alguém submetido a outro à força. Na Bíblia, fala-se em escravos e parece que em algumas colônias romanas e no Egito antigo o trabalho escravo era fundamental, mas não se sabe de fato o estatuto que eles tinham. Durante todo o período das Cruzadas, cristãos e mouros também eram escravizados pelos dois lados – conta o historiador Zamparoni.
Também na Grécia antiga e sociedades do oriente se
praticava a escravidão. Mas foi no século XVI, com a chegada dos
europeus ao gigantesco continente americano que se criou um novo modelo
de sociedade, diz o historiador:
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Pela primeira vez na história da humanidade, a escravidão se tornou a base da sustentação econômica – explicando a incrível proporção que o tráfico Atlântico assumiu e porque, a partir daí, se criou a associação equivocada entre escravidão e africanos.
Mesmo antes da chegada dos europeus na África, lá já
havia escravidão e tráfico. Uma figura presente em muitas sociedades era
o cativo, como explica o historiador:
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Uma espécie de refém de guerra, que podia ser resgatado e continuava sendo visto como um cidadão, ainda que de outra sociedade.
Não sendo resgatado, o cativo se tornava um escravo,
“um não cidadão, sem direitos civis”. Em alguns lugares, eram proibidos
de ter família, como os eunucos, submetidos a humilhações e castigos
físicos. Mas ser escravo, curiosamente, nem sempre significava uma
situação econômica ruim:
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Não tendo linhagem na comunidade, os escravos não tinham direito à sucessão, por isso os reis os preferiam como assessores, policiais, cobradores de impostos: eram mais confiáveis, não teriam porque matar o rei. Assim, muitos escravos acabavam gozando de regalias.
Para deslocar e comercializar esses escravos criou-se o tráfico:
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No século XII, já havia tráfico na costa oriental africana e, no século XV, com a expansão islâmica, estabelece-se o tráfico transaariano, no norte da África.
Mas nenhuma dessas sociedades dependia dos escravos
para sobreviver e o contingente deslocado era pequeno perto do que os
europeus traficaram: as estimativas vão de 10 a 15 milhões de africanos
transportados para a América, sendo cerca de 1.200.000 para a Bahia2.
Quando chegaram ao Brasil, em 1500, os portugueses
encontraram uma imensidão de terras cultiváveis, um litoral sem fim,
água em abundância e riquezas minerais. Mas, para enriquecer com tudo
isso, era preciso que alguém trabalhasse. Tentaram obrigar os índios,
que resistiram, morreram ou fugiram. Começou então a importação dos
africanos, como já faziam em pequena escala nos Açores e Madeira.
Zamparoni explica que, no começo, eles até tentaram capturar por conta
própria:
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Há o relato de um comerciante veneziano que participou de uma viagem ao rio Gâmbia, em 1453, a serviço de Portugal, onde ele conta que os barcos portugueses chegavam à noite, invadiam as comunidades de surpresa e aprisionavam quem conseguiam pegar.
O método, entretanto, era arriscado e
pouco lucrativo, por isso, começaram a estabelecer acordos com os
líderes locais para que eles próprios fornecessem os escravos. Foi
assim, com a ajuda de reis tribais ditadores e ambiciosos, que se
estruturou o tráfico humano numa proporção inédita no mundo.
Centrando os seus dados no tráfico que abastecia a
Bahia, Pierre Verger explica que, na segunda metade do século XVI,
começam a ser trazidos africanos da costa oeste, o ciclo da Guiné.
Surgem aí as primeiras feitorias portuguesas na África, onde se faziam
as trocas, como o castelo de Arguim, o de São Paulo de Luanda e o
castelo de São Jorge da Mina. No século XVII, a perda desse último
castelo para os holandeses, entre outros motivos, reordenou as rotas, e
passaram a ser trazidos africanos do Congo e Angola. No começo do século
XVIII, diz Verger, novos arranjos comerciais inauguram o ciclo da Mina,
pois os portugueses só foram autorizados a traficar, sob certas
condições, em quatro portos na costa do Daomé. Zamparoni esclarece como
eram feitos os negócios:
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As principais moedas de troca eram escravos da África; aguardente, tabaco e açúcar da América e panos, objetos de metal – como ferramentas e armas – e objetos de adorno vindos da Europa.
No século XVIII, entretanto, os traficantes baianos
conseguiram uma grande autonomia, pois aqui havia um produto de grande
aceitação na África: um fumo de terceira categoria, chamado “soca”, cuja
entrada era proibida em Portugal, conta Verger. Como somente no
Recôncavo baiano se produzia esse tabaco feito de pequenas folhas
untadas em melado, os traficantes baianos podiam comercializar
diretamente com a África, escapando ao controle de Lisboa. Em fins do
século XVIII, começa o quarto e último ciclo de tráfico, dessa vez em
direção ao golfo do Benin, trazendo em sua maioria africanos
nagôs-iorubás e também os jejes.
Como, no Brasil, a demanda por escravos não cessava –
seja para trabalhar no campo, nas casas, como artesãos, carregadores,
vendedores e tudo mais que exigisse esforço -, o tráfico era sempre
lucrativo. Para vigiar os negócios de perto, alguns traficantes até se
estabeleceram na África, como Domingos José Martins. Domingos era
parceiro de Joaquim Pereira Marinho e foi responsável pela rapidez com
que os escravos eram embarcados nos vários barcos de Marinho. Ele
conseguia isso mesmo numa época em que tratados internacionais tornaram a
prática ilegal e severamente perseguida. Mas, antes de Domingos, nas
primeiras décadas do século XIX, um baiano tinha reinado em Uidá. Era
Francisco Félix de Souza, descrito como “o mais rico e o mais famoso dos
negreiros de todos os tempos”. Homem sombrio e solitário, pai de mais
de 80 filhos e amigo do rei do Daomé, que lhe deu o título de Xaxá,
Souza chefiava com mão-de-ferro dezenas de capitães de navios negreiros
que hospedava com suntuosidade, descobriu Verger em suas pesquisas.
Félix, que tinha ido para a África como escrivão de um forte português,
alcançou muito poder após anos de perseguições e alianças com reis
locais. Conta-se que, em seus domínios, onde vivia como um príncipe,
recebia até os oficiais britânicos encarregados de impedir o tráfico que
tanto o enriquecia.
FASE ILEGAL
Para
atrair as crianças a locais ermos e distantes, davam a elas frutas,
pipocas, acarajés e acaçás. Com danças, cantigas e brincadeiras
distraía-se a atenção dos pequenos até que, ao anoitecer, apareciam os
mercadores de escravos e as levavam. Para capturar os adultos, havia
técnicas como essa: “Improvisavam-se mercados, e quando havia muita
gente reunida davam o cerco, e bem poucos eram os que escapavam”. Quem
contou tudo isso foi Manuel Querino, em seu livro Costumes africanos no Brasil.
Essas e outras histórias sobre a captura de homens e mulheres nos
sertões africanos para alimentar o tráfico, ele ouviu na Bahia, em fins
do século XIX, de velhos africanos. A captura à força ficou para trás,
mas a escravidão ainda continua sendo atual. Para quem não sabe, apesar
de todos os acordos internacionais proibindo o tráfico humano e a
escravidão, do século XIX para cá, o comércio baseado na exploração do
trabalho alheio e cerceamento da liberdade nunca deixou de existir.
Em nosso mundo, as coisas freqüentemente são assim:
quem é mais rico e forte militarmente, dá as ordens e os outros
obedecem. Ou então se rebelam. No século XIX, os “xerifes do mundo” eram
os ingleses e foi em boa medida pela pressão deles que o tráfico de
escravos se tornou ilegal. Apesar do discurso humanitário, os motivos
eram claramente econômicos. Depois de lucrar muito com o tráfico, os
ingleses resolveram combater essa prática por terem investido em um
outro tipo de sistema produtivo, o industrial. E daí?
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Por conta disso, eles precisavam de consumidores para os seus produtos, e um trabalhador livre consome mais do que um escravo – sintetiza o professor Zamparoni.
Isto é, para os novos capitalistas, a escravidão não
era mais oportuna. Era preciso que o trabalhador – ainda que continuasse
sendo tão duramente explorado quanto antes – tivesse poder aquisitivo
para consumir os produtos gerados pela indústria. Mas, eles não deixavam
de participar do “esquema”. Como relata Pierre Verger em seu livro Fluxo e Refluxo,
a maioria dos artigos europeus comercializados no tráfico eram
ingleses: fuzis de Birmingham, tecidos de Manchester, chumbo de
Liverpool e outros. E, quando o tráfico se tornou ilegal, muitas vezes,
após aprisionarem navios negreiros, os ingleses remetiam essa carga
humana para as suas novas colônias, onde precisavam de “mão-de-obra”.
Como maior potência mundial, a Inglaterra fez valer
os seus interesses das mais diversas formas, pressionando países como o
Brasil a pôr um fim no sistema escravocrata. Foi condição imposta para
reconhecerem a nossa independência, patrulhavam nossas águas
territoriais, apreendiam e destruíam navios negreiros brasileiros. A
contragosto, em 1826, o Brasil assinou um tratado se comprometendo a
colaborar para o fim do tráfico. Em 1830, proibiu o tráfico. Em 1831,
decretou uma lei proibindo a entrada de novos escravos no país. Ainda
que, na prática, continuasse acobertando seus traficantes. Desde aquela
época já havia uma grande diferença entre o que manda a lei e o que de
fato acontece.
Em Salvador, até 1831, os escravos eram desembarcados
no próprio porto da cidade. Em seguida, como explica o historiador e
professor João José Reis:
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Os escravos eram vendidos de diversas formas, inclusive de porta em porta, ou seja, havia comércio ambulante de escravos. Havia ainda comerciantes que vendiam escravos, entre outras mercadorias que comercializavam, sendo poucos os que se especializavam na mercadoria humana. Estes tinham armazéns em diversos trapiches da Cidade Baixa, na Conceição da Praia, na Ladeira do Taboão e outros lugares. Os jornais também anunciavam a venda direta e leilões de escravos.
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Os desembarques tornaram-se clandestinos e aconteciam nos mais diversos locais, como a foz do Joanes, Itapuã, Armação, Itaparica, Funil, etc. E a venda também era camuflada. Por exemplo, vendia-se escravo novo como se fora ladino – diz Reis.
Para lidar com a proibição, o traficante José de
Cerqueira Lima construiu um túnel que ia do mar até a sua mansão na
Vitória, por onde passavam os comboios de escravos, conta Verger. A casa
foi demolida e, em seu lugar, construído o prédio da Saúde Pública. Já
Joaquim Pereira Marinho e outros desenvolveram técnicas para tornar o
embarque na África e desembarque aqui mais ágil, usando barcos velozes.
Mas o mundo de fato estava mudando. O movimento abolicionista ganhava
força, a opinião pública era cada vez mais contrária à escravidão, por
isso o tráfico de africanos foi cessando.
Na Bahia, o último desembarque aconteceu num mês de
outubro. No dia 03, o navio Relâmpago içou âncoras, saindo de Lagos,
baía do Benin, em direção à Bahia. Ele levou 26 dias para atravessar o
oceano que separa a África e o Brasil, tentando ao máximo não chamar a
atenção. Mas, assim que se aproximaram de Morro de São Paulo, na manhã
do dia 29, foram percebidos pelo iate de guerra brasileiro Itapagipe e a
perseguição começou. O Relâmpago foi mais rápido e conseguiu escapar.
De fato, como se imaginava, ele transportava uma carga ilegal: 500
africanos que seriam escravizados. O desembarque foi feito na Pontinha.
Como só havia um bote, os homens eram obrigados a se jogar no mar para
alcançar a terra. Sem saber nadar, dezenas deles morreram afogados. Os
sobreviventes foram levados para um engenho próximo e depois escondidos.
No mesmo dia, à noite, a notícia chegou ao chefe de polícia da capital,
João Maurício Wanderley, que seguiu para o local com 40 soldados. Após
muitas buscas, em primeiro de novembro, 285 africanos foram encontrados e
libertos. Por causa de suas amizades, o senhor de engenho conseguiu ser
absolvido, mas o dono do barco, o baiano Marcos Borges, o capitão
venezuelano Benito Denisan e dois pilotos espanhóis, Belchior Garcia e
Miguel Marinho foram condenados à prisão, ao pagamento de multas e a
custear as despesas do retorno à África de cada africano que haviam
traficado. Essa história, que aconteceu em 1851 e foi contada com muito
outros detalhes por Pierre Verger em seu livro, marca o fim do tráfico
de escravos africanos na Bahia. Uma data memorável, que significou o
início de um novo tempo ou, pelo menos, de esperança em dias melhores.
Em 1888, veio a abolição, encerrando a etapa exclusivamente africana do
tráfico humano.
QUILOMBOS
A suspensão legal do direito de escravizar não foi
suficiente para eliminar completamente a prática no mundo, que continua
sobrevivendo até os dias de hoje, e nem para libertar da pobreza a
maioria dos negros brasileiros. Mas, se as marcas da escravidão
continuam visíveis, os sinais da resistência também se mantém vivos.
Pois, onde houve escravidão, houve também as mais diversas formas de
resistir a ela, sendo a mais explícita de todas a formação de quilombos,
comunidades de escravos fugidos do cativeiro. O historiador e professor
Ubiratan Castro de Araújo explica que os quilombos foram:
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Uma transplantação para o Brasil de uma experiência com acampamentos militares nômades da África Central, especialmente na região onde hoje é Angola.
O que não significa que os quilombos ou mocambos
fossem comunidades completamente isoladas e que reunissem apenas negros.
Além de escravos fugidos, alguns quilombos abrigavam negros libertos,
índios e brancos que fugiam da justiça3.
Em Salvador, eles existiram em áreas onde hoje se localizam bairros
como Cajazeiras, Pirajá, Itapuã, Matatu e Alto da Sereia. A herança de
organização e luta também está presente em bairros que são considerados
territórios culturais negros, tanto pela manutenção de tradições quanto
pela invejável organização dos seus moradores, como Candeal, Curuzu e
Calabar. Para milhares de brasileiros, comunidades como estas
significaram o primeiro passo para uma vida com autonomia e dignidade.
A definição de quais são as áreas remanescentes de
quilombos é um tema polêmico entre os especialistas. Segundo o
historiador João Reis, um dos maiores especialistas do país em estudos
sobre revoltas negras, em Salvador, por exemplo, até hoje só foram
encontrados documentos que confirmam duas áreas como locais onde
existiram quilombos: o Quilombo do Urubu, entre Pirajá e Cabula, e o
Quilombo do Buraco do Tatu, em Itapuã.
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Para a lei colonial, constituía quilombo toda reunião de cinco ou mais negros em local ermo. Mas trata-se de negros fugidos – informa Reis.
Ele também comenta que Mares e Cabula foram apontados
pelo Conde da Ponte, governador da Bahia no século XVIII, como local de
reunião de negros fugidos.
O historiador e professor Walter Passos, autor do livro Bahia, terra de quilombos,
diz que, hoje em dia, muitas comunidades pobres atribuem a si mesmas um
passado quilombola, o que até pode ser correto politicamente, mas não
historicamente. Em alguns casos, diz ele, o local teria sediado não um
quilombo, mas uma senzala. De qualquer forma, além da pesquisa em
documentos, ele defende como fundamental uma investigação da tradição
oral:
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Os documentos só falam dos quilombos que foram destruídos.
Para chegar à definição do Candeal, Curuzu, Calabar e
Alto da Sereia como áreas remanescentes de quilombos, Passos partiu
justamente das histórias contadas pelos moradores antigos e também
considerou a presença de tantas famílias negras um forte indicativo.
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No bairro da Liberdade, até 30 anos atrás, antes da chegada da primeira leva de cearenses, só havia negros – exemplifica ele, lembrando que Curuzu, nome de um dos bairros que integram a Liberdade, é uma palavra banto.
Além de Pirajá e Itapuã, alguns historiadores falam
de documentos que comprovam a existência de quilombos suburbanos, no
início do século XIX, em áreas como Cabula e Matatu. Para o historiador e
professor da Universidade de Minnesota (EUA) Stuart Schwartz, sendo um
período em que aconteceram várias revoltas de escravos, é possível que
pessoas envolvidas nessas lutas tenham sido responsáveis pela formação
de alguns desses quilombos. As revoltas geraram também uma perseguição
mais intensa. No Cabula, um quilombo foi destruído em 1807 e, em 1814,
quilombolas de Itapuã, cerca de 20 negros, atacaram armações de pesca,
mataram brancos e mulatos, incendiando casas e libertando escravos,
relata Schwartz em seu texto Cantos e quilombos numa conspiração de escravos haussás.
Pela sua localização estratégica, a região de Pirajá
esteve envolvida em muitas lutas. Além de ser uma porta de entrada para
as cidades do Recôncavo baiano – pela Estrada das Boiadas – e da
proximidade com o mar, através de Plataforma, o bairro tem até hoje uma
mata densa. Lá, viveram índios tupinambás, negros fugidos, revoltosos e
invasores de todos os tipos. Antes conhecida como Mata do Urubu, a área é
hoje o Parque São Bartolomeu, uma importante reserva ecológica.
O Quilombo do Urubu foi um dos poucos com existência
documentada, assim como a sua extinção. Ainda que seja difícil precisar
datas e localização quando se trata desse tema, o professor Reis
acredita que esse foi o quilombo mais duradouro entre os que existiram
em Salvador, sobrevivendo por cerca de 20 anos. Durante as lutas da
Independência, o general Labatut realizou uma violenta perseguição
contra o quilombo. Num dia de dezembro, ele foi atacado e as 300 pessoas
que estavam ali foram dizimadas. Entre os integrantes desse quilombo,
um deles acabou perpetuando o seu nome, por sua bravura e pelo fato de
ser uma mulher. Segundo Pierre Verger, em seu livro Fluxo e Refluxo, em 1826, eles protagonizaram uma revolta que não teve êxito:
- A polícia e a tropa intervieram duramente. Massacraram e capturaram, após um sério combate, alguns negros revoltados, entre eles uma negra, Zeferina, que tinha um arco e flechas na mão.
Zeferina conseguiu escapar da morte e foi condenada a
trabalhos forçados. Apesar da importância desse quilombo, não é fácil
encontrar moradores de Pirajá e áreas próximas que saibam histórias a
respeito. Uma das exceções é Antonio Mendes, um técnico agrícola morador
de Valéria, que é também pesquisador diletante. Lendo livros a respeito
e ouvindo histórias contadas por moradores muito idosos, ele descobriu
algumas coisas:
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O quilombo surgiu de negros fugidos dos engenhos que existiam em Pirajá desde 1633 e de outras procedências. Às vezes até de escravos que conseguiam fugir logo após desembarcar dos navios negreiros no Terminal da França.
Para Mendes, alguns fatores colaboraram para a
decadência do Quilombo do Urubu, como a progressiva diminuição da mata, à
medida que os engenhos iam avançando, e as inúmeras batalhas e invasões
que ocorreram em Pirajá. Em sua opinião, a maior contribuição dos
quilombolas ao que hoje é o Parque São Bartolomeu foi a sua cultura.
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Não era somente uma ocupação agrária. Eles criaram terreiros, trouxeram plantas importantes da África que introduziram no parque, como a amescla. A forma de organização também era diferente, eles viviam por conta própria, não se submetiam a nenhuma lei branca.
As histórias sobre o Quilombo do Buraco do Tatu são
ainda mais nebulosas, mas acredita-se que ele existiu numa área próxima à
Estrada Velha do Aeroporto, entre Itapuã e Cajazeiras. Os moradores de
Cajazeiras garantem que uma enorme pedra situada numa baixada, onde
antes havia água, é peça fundamental da história desse quilombo. Núbia
Nascimento, moradora do bairro, já fez até um livro chamado Breve história da Fazenda Independência
contando esta e outras histórias. Segundo ela, a pedra, que possui um
grande buraco, era usada como passagem e esconderijo pelos quilombolas,
quando perseguidos. Até políticos já estiveram por lá para ver de perto a
tal pedra.
Ainda é possível encontrar em Cajazeiras a
exuberância da mata que protegia os quilombolas. Segundo Núbia, toda a
área que ia do Subúrbio a Itapuã, passando por Cajazeiras, era
considerada tão valiosa que foi durante muito tempo preservada da
ocupação, reservada para o rei D. João VI, que designava fidalgos para
apenas administrá-la. Como se tratava de uma região muito grande, aos
poucos a área foi sendo desmembrada e doada a famílias abastadas. O
bairro de Cajazeiras, como o conhecemos hoje, só surgiu com a construção
dos primeiros conjuntos habitacionais, a partir da década de 1980.
O professor de Educação Artística Edvaldo Santana,
mais conhecido como Nadinho do Congo, um morador antigo, diz que ainda é
possível encontrar no bairro pessoas que pouco conhecem Salvador.
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Antigamente, você levava um dia inteiro andando pra ir daqui ao centro da cidade – explica ele, para mostrar como o local era favorável a sediar um quilombo.
Nadinho acredita que tudo isso foi fundamental para
manter a presença de tradições africanas em Cajazeiras. Parece estar
correto, já que o “Filhos do Congo”, o bloco afro de Cajazeiras,
presidido por ele mesmo, foi premiado como o melhor bloco afro do
carnaval de Salvador em 2000.
A construção da Estrada Velha do Aeroporto, que
margeia o bairro, foi um elemento transformador, facilitando a locomoção
e aproximando Cazajeiras do resto da cidade. Mas o bom pedaço de mata
com árvores enormes que ainda resta no local faz a pesquisadora Núbia
sonhar que vestígios contundentes da existência do quilombo ainda possam
ser encontrados e, assim, ajudar a contar melhor essa história.
TERRITÓRIOS NEGROS
Uma ideia que pode modificar inteiramente a abordagem
da questão é a noção de quilombos contemporâneos, comenta o sociólogo e
professor Valdélio Silva, que fez uma dissertação de mestrado sobre o
tema. Áreas que são, comprovadamente, remanescentes de quilombos,
recebem o apoio da Fundação Cultural Palmares para conseguir a
certificação do governo federal e posterior demarcação e título de posse
das terras (sob responsabilidade do INCRA). Mas conceitos mais amplos,
como “territórios negros” ou “comunidades tradicionais negras”, também
vêm sendo utilizados pelo órgão em sua busca de desenvolver iniciativas
que promovam os afro-brasileiros. Na prática, isto pode significar o
desenvolvimento de políticas públicas que garantam proteção, restauração
ou revitalização para locais como terreiros de candomblés, comunidades
rurais ou até bairros.
É dentro dessa concepção de um “território cultural
negro”, um “quilombo vivo”, que alguns pesquisadores encaram bairros de
Salvador como Liberdade e Candeal. Locais que, como define o professor
Valdélio, “se nutrem do passado para viver o presente”. Trata-se de
bairros com forte predominância negra, onde se preservam tradições
ancestrais. Em comum com os quilombos clássicos, esses bairros têm uma
impressionante história de organização e experiências que buscam
desenvolver a autogestão.
Mesmo localizados em áreas afastadas do centro da
cidade, estabelecer-se nesses bairros sempre envolveu muito esforço.
Além dos perigos e do desconforto que os desbravadores tiveram que
enfrentar, até hoje moradores desses locais têm problemas com a posse da
terra. Problema similar ao das comunidades remanescentes de quilombos.
Os moradores da Liberdade, por exemplo, para legalizar seus imóveis e
terrenos, precisam pagar uma taxa à Companhia Progresso & União
Fabril da Bahia, a quem legalmente se atribui a propriedade das terras.
Além da Liberdade, pertencem à Companhia Progresso & União Fabril da
Bahia largas extensões de terra em Pirajá e São Caetano.
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O lugar já traz a cara do nome: liberdade todo mundo gosta, todo mundo quer – diz a ialorixá Mãe Hilda, moradora do Curuzu desde a década de 30.
Considerada uma das áreas mais populosas da Região
Metropolitana de Salvador, a Liberdade inclui microáreas como Guarani,
Sieiro, Japão, Pero Vaz e Curuzu. Segundo dados do Censo Demográfico
2000 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apenas o
Curuzu tinha aproximadamente 15.265 habitantes. Formado inicialmente
por “roças” – com poucas casas, árvores frutíferas, pequenas plantações e
criação de animais – o primeiro nome do bairro foi Vista do Bonfim,
pois era possível enxergar a famosa igreja no topo da colina. Por lá,
passava também a famosa “Estrada das Boiadas”, um caminho por onde se
transportava gado para o matadouro de Salvador.
Os moradores do Curuzu contam que as casas eram de
taipa e as mulheres trabalhavam geralmente como vendedoras – de frutas
ou de vísceras – lavadeiras ou empregadas domésticas. Muitos homens eram
marceneiros, pedreiros e carregadores, transportando todo tipo de
cargas, com burros, carroças ou com seus próprios corpos. Apesar do
crescimento da população, do número de casas e da conseqüente diminuição
do espaço, Dona Luiza dos Santos, que já viveu mais de oito décadas,
comemora a chegada do progresso:
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Antes o chão era de barro, não tinha energia, água encanada, esgoto. Pra ir à escola, a gente tinha que ir andando do Curuzu até a Lapinha.
A boa relação entre os vizinhos e muita capacidade de
organização parecem ser outras características quilombolas presentes
nesses locais.
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Fui criada aqui e nem eu nem meus pais nunca tivemos nenhuma briga com vizinho, nenhum inimigo – garante Dona Alaíde Bispo, moradora do Curuzu.
Existe união entre os moradores, confirma Mãe Hilda, mas ela afirma que já foi melhor.
-
Há uns 40 anos, todo mundo se tratava como parente. Qualquer dor e o vizinho já vinha pra dar um chá.
Mesmo com as dificuldades, ela comenta, orgulhosa,
que muitas famílias conseguiram criar seus filhos para “respeitar e ser
respeitado e fazerem alguma coisa pelo lugar em que nasceram”. A sua
família tem tradição no ramo. O pai de Mãe Hilda tinha um afoxé e o seu
filho, Antonio Carlos dos Santos, o “Vovô do Ilê”, é o fundador e
presidente do famoso bloco afro Ilê Aiyê, um dos melhores exemplos da
capacidade de organização do Curuzu. Indo muito além do seu papel como
“agremiação carnavalesca”, o Ilê se tornou um marco na valorização da
cultura afro-brasileira, da auto-estima de negros e mestiços e ajudou a
colocar em debate o tema do racismo.
Apesar da fama internacional, de ser homenageado e
copiado por muitos artistas, o Ilê permanece no Curuzu e diversifica
suas atividades. Oferece às crianças do bairro o acesso gratuito ao
ensino fundamental na Escola Mãe Hilda e a oportunidade de estudar
música através da Banda Erê. Segundo Vovô, o diferencial da escola é o
currículo mais criativo e o estímulo à cidadania. As festas promovidas
pelo bloco, principalmente a saída no sábado de Carnaval, levam ao
bairro a classe média baiana, turistas, além de celebridades nacionais e
internacionais, mostrando que o convívio é possível. Além do Ilê,
outras entidades afro-carnavalescas que surgiram na área foram o Vulcão
da Liberdade, Oriobá, Alabê, Odara e Muzenza.
Também qualificado por alguns como um quilombo vivo,
no bairro do Candeal de Baixo, cooperação é uma palavra-chave, garantem
moradores e líderes comunitários. Cada um arrisca um motivo, buscando na
história do bairro ou numa disposição inata das pessoas a justificativa
para tanta solidariedade. O resultado disso é que a comunidade passou
por grandes transformações nos últimos anos, com obras para melhoria das
ruas e casas, além da criação de uma escola de música
profissionalizante que oferece recursos de primeiro mundo. Tudo isso sem
perder a tranqüilidade, pois ainda há quem durma de porta aberta.
Como no caso da Liberdade, foi preciso muita
persistência para habitar e construir o Candeal de hoje. Os moradores
mais antigos falam das antigas fazendas de dendê, não esquecem das
enormes sucuris que assolavam o local e do quanto era deserto. Dona
Nicinha, moradora há mais de 30 anos, diz que sentiu medo logo que se
mudou para lá. Helena Pereira, moradora desde 1949, relembra os
primeiros tempos:
-
Aqui tudo eram fazendas que aos poucos foram dando lugar a loteamentos e trazendo moradores novos ao bairro.
Quando o assunto é a vizinhança, ela se entusiasma:
-
É um lugar maravilhoso, não tem confusão, barulho, morte.
A paz reina até entre as religiões: o Centro
Comunitário Madre Helena, da igreja católica, onde funciona uma escola
comunitária e celebram-se missas, funciona bem em frente ao candomblé de
Mãe Angelina. Segundo Irmã Leonora, responsável pelo centro, a
convivência é muito respeitosa.
Mas, se é preciso brigar, como bons quilombolas,
ninguém desanima. Coordenadora da Associação de Moradores da Rua Nove de
Outubro e moradora do bairro há 15 anos, Graciete Batista conta
sorrindo as muitas batalhas vencidas por eles. Uma das mais importantes
foi evitar que o loteamento de classe média alta que se instalou há
poucos anos nas proximidades da comunidade conseguisse impedi-los de
transitar por uma importante via de acesso aos bairros da Pituba,
Itaigara e Iguatemi. Para manter afastados os “vizinhos pobres”, os
novos moradores tinham mandado construir um muro.
- Destruímos o muro, fomos à imprensa, à prefeitura e vencemos – relembra Graciete.
Os projetos mais ousados do Candeal, como não podia
deixar de ser, vieram do seu filho mais ilustre, o músico Carlinhos
Brown, que, apesar do sucesso internacional, não perde de vista o seu
bairro. Criador do grupo Timbalada e da casa de shows Candyall Gueto
Square, o artista conseguiu levar multidões ao Candeal de Baixo para
assistir aos “ensaios” do grupo. Para alguns moradores, uma oportunidade
de conseguir uma renda extra com a venda de bebidas e lanches. Mas o
barulho gerado e a intensa movimentação de pessoas dividiu opiniões,
levando à suspensão dos grandes shows, que agora são realizados em outro
local da cidade.
Menos polêmicos são os outros projetos: a Escola
Pracatum e o Tá Rebocado, ambos desenvolvidos pela Associação Pracatum. A
escola profissionalizante de músicos funciona desde setembro de 1999 e
tem como público-alvo prioritário adolescentes do Candeal entre 14 e 18
anos, com aptidão para a música, que estejam freqüentando a escola
regular, explica a diretora da instituição, Selma Calabrich. No
currículo, aulas de percepção musical, canto-coral, fisiologia da voz,
teclado, violão, percussão, leitura de partitura e muita audição de CDs.
Já o Tá Rebocado é um projeto de intervenção
urbanística que envolve a abertura de novas ruas, saneamento, ampliação
da iluminação pública e rede de água, drenagem, construção de mais de
uma centena casas, reforma de algumas dezenas, construção de praça,
campo de futebol, um posto de saúde, centro social e recuperação da
famosa fonte de água mineral do Candeal, explica a arquiteta Neise
Souto. O recurso foi obtido com a Caixa Econômica Federal, dentro de um
projeto do governo estadual. Animada, a comunidade participa e opina,
através de reuniões com a coordenação do projeto.
Apesar das iniciativas e das inúmeras vitórias,
Pirajá, Cazajeiras, Liberdade, Candeal e muitos outros bairros negros de
Salvador e do Brasil continuam mantendo também muitas marcas da origem
escrava dos ancestrais dos seus moradores. Pouca instrução e muito
desemprego são as mais evidentes. Mesmo com o comércio intenso que
caracteriza a Rua Lima e Silva, o desemprego é um dos maiores problemas
da Liberdade, inclusive porque esses estabelecimentos não empregam
muitos moradores, explica Paulo Cambuí, presidente do Conselho
Comunitário de Segurança e Sociocultural da Liberdade. Para ele, as
escolas municipais e estaduais, além das particulares e cursos
ministrados pela Casa do Trabalhador não são suficientes para atender a
uma população de aproximadamente 88.589 pessoas, segundo dados do IBGE.
Em Pirajá, bairro que entrou para a história como palco de muitas
importantes batalhas que garantiram a independência da Bahia e do
Brasil, os problemas também são graves. Sem cursos profissionalizantes
ou centros sociais, as escolas públicas não conseguem atender à enorme
demanda. Apenas uma delas oferece ensino de 2º grau, informa João
Guedes, presidente da Associação Beneficente dos Moradores do Bairro de
Pirajá.
Como conseqüência direta, surge a violência. Na
Liberdade, locais como a Avenida Peixe e a Rua do Céu já foram
considerados intransitáveis, quando controlados por gangues de
adolescentes. A situação melhorou, mas o problema permanece longe de ser
superado. Em Pirajá, o epicentro da violência é o Parque São
Bartolomeu, um santuário ecológico para ambientalistas e adeptos do
candomblé e única área de lazer do bairro, mas praticamente inacessível
aos moradores pela ação de bandidos.
Apesar de tudo, ninguém está pensando em desistir,
pois ao lado da insegurança e pobreza, também há solidariedade e alegria
no cotidiano dos moradores desses quilombos vivos. Em Pirajá, tentando
colaborar com os menores, a Associação criou uma escolinha, que atende
crianças do maternal a alfabetização. No Candeal, além das intervenções
urbanas que já realizou e das atividades da Escola Pracatum, a
Associação Pracatum não se descuidou também dos cursos
profissionalizantes, alfabetização de adultos, formação de agentes
comunitários de saúde e cursos de inglês. No Curuzu, os cursos e
iniciativas do Ilê Aiyê foram expandidos com a inauguração do Centro
Cultural Senzala do Barro Preto, uma grande sede com estrutura e espaço
suficiente para as os ensaios, oficinas, aulas de música, dança, balé,
informática, cidadania, cursos profissionalizantes, instalação de um
infocentro, atelier de costura, realização de shows. Descendentes de
pessoas que não tiveram acesso à instrução e a adquirir bens, os
quilombolas contemporâneos lutam pelo direito, pelo menos, à liberdade.
Muitos deles nem sabem o que foi um quilombo e têm pouco tempo para
reflexões. Desejando para si, seus amigos e vizinhos um mundo melhor,
tratam cotidianamente de construí-lo.
1“O
número de cativos embarcados em cada navio dependia da capacidade de
suas instalações. Nos séculos XVI e XVII, uma caravela portuguesa era
capaz de transportar cerca de 500 cativos e um pequeno bergantim podia
transportar até 200. No século XIX, os traficantes utilizaram os navios a
vapor, o que reduziu o tempo das viagens. Nos últimos anos do tráfico, a
média de escravos transportados por navio era de 350” (ALBUQUERQUE e
FRAGA FILHO, 2006: 48).
2“Os
números não são precisos, mas estima-se que, entre o século XVI e
meados dos século XIX, mais de 11 milhões de homens, mulheres e crianças
africanos foram transportados para as Américas. Esse número não inclui
os que não conseguiram sobreviver ao processo violento de captura na
África e aos rigores da grande travessia atlântica” (ALBUQUERQUE e FRAGA
FILHO, 2006: 39).
3“[...]
era exatamente por se localizarem perto de núcleos de povoamento que os
quilombos inquietavam as autoridades e causavam tantos transtornos aos
proprietários de terras e escravos” (ALBUQUERQUE e FRAGA FILHO, 2006:
120).
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